(Com um olhar indireto para o irmão sentado ali do lado. É uma "conversa" meio que pensando alto talvez, mas com um certo tom de ironia. Ele sabe que o culpado foi o seu irmão, ali, sentado, se importando como sempre apenas com sua própria vida, olhando pro seu próprio nariz, embebido no seu egoísmo. e que nunca assumirá sua culpa, como muitos irresponsáveis hoje em dia nessa Pandemia de covid-19). Segue:
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O mais curioso é que Mamãe e papai não saiam pra nada, lembra? Nada!… aqueles ali foram exemplo, hein?! Queriam viver! Aqueles ali queriam!
Eles tinham muitas preocupações com todo mundo... principalmente com os entregadores de comida, né? de contaminá-los… não de serem contaminados pelo entregadores, nem era isso, mas deles contaminarem os entregadores. Afinal de contas eles não conseguiam higienizar tudo exatamente que chegava da rua, nos mínimos detalhes, não é isso? nem dava,né? era muita coisa pra eles… velhinhos… imagina! Deve ter sido ali.
E você sempre na tua né maninho? nas baladas, aproveitando a tua vida, barzinho… hein?! namoradinha... tinha que curtir a tua vida mesmo! né não? Jogar tua juventude pela janela?! Ficar em casa vendo netflix, lavando e cozinhando pra papai e mamãe? e a vida passando la fora?! Te poupe né, Gustavo?! Era viver a vida, não é assim que cê dizia? (muda o tom) Aproveitar a vida enquanto se tem!
O estranho é que mesmo com tantas dificuldades eles se esforçavam e tentavam lavar tudo com tanto cuidado… tudo que chegava da rua, tudo. Mamãe um dia me mandou um mensagem chorando dizendo que ela tinha comido banana com sabão (risos). Cê tava lá, não né? Mamãe disse que parece que cê tinha saído pra dar um rolé! Ai que saudade da véia!
Eles atendiam a porta de máscaras, não visitavam ninguém, não recebiam visitas… era difícil até papai aceitar que tinha que descer pra pegar um sol… achava muito arriscado. Eu mesmo só vi uma vez os dois da janela... aquele momento ali imortalizou na minha memória.
Eles nem puderam ver o João Gabriel, nem pegar no colo… partiram assim, sem nem o último abraço.
Eu não consigo entender como eles pegaram esse vírus. Eu não consigo entender. Só viviam vocês três naquela casa, Gustavo, só vocês três.
Autor - Hellon Rocha
(nº 058)
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